A ampliação do programa Smart Sampa, da prefeitura de São Paulo, acende o alerta de especialistas em segurança pública e direitos civis. Totens com câmeras de reconhecimento facial espalhados por diferentes pontos da capital estão sendo instalados sem transparência nem diálogo com a população, segundo Pablo Nunes, coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC).
“Esses projetos se notabilizam por uma falta completa de diálogo com a sociedade”, afirmou Nunes em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. Para o pesquisador, além da opacidade sobre os dados coletados, operadores e finalidades, há um histórico preocupante por trás da iniciativa. Ele lembra que o programa começou focado no metrô de São Paulo. “Já havia coisas muito preocupantes, como, por exemplo, a necessidade das câmeras identificarem cenas de vadiagem, sem nenhuma compreensão do que isso queria dizer”, relata. Na ocasião, o termo de referência foi suspenso pela Justiça.
O uso de inteligência artificial para identificar suspeitos também levanta críticas técnicas e éticas. Dados da Rede de Observatórios da Segurança mostram que 90% das pessoas presas por reconhecimento facial em 2019 no Brasil eram negras. “A inteligência artificial não é tão inteligente assim”, diz Nunes. Segundo a pesquisa, os algoritmos erram 34% mais com mulheres negras do que com homens brancos.
Mesmo alegando seguir a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a prefeitura está isenta da regra no caso de segurança pública, ressalta o coordenador. “Temos palavras vazias vindas da prefeitura. No Brasil, nenhum projeto tem elementos básicos de transparência”, afirma. Entre os pontos ausentes estão informações como o tipo de software utilizado, margem de erro, número de pessoas presas ou confundidas pelas câmeras e relatórios de impacto.
Além dos riscos à população negra e periférica, Pablo Nunes destaca o alto custo dos equipamentos. “São câmeras caras. Tem projetos de bilhões de reais que têm sido desenvolvidos aqui no Brasil sem, contudo, que a gente entenda exatamente essas questões muito simples e muito básicas”, revela.
Para o CESeC, o debate deveria começar pelo mínimo: que a população entenda como essas tecnologias funcionam, quais dados estão sendo coletados e como o dinheiro público está sendo investido, especialmente em um país com demandas urgentes em áreas como moradia, saúde e saneamento básico.
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