Após as primeiras projeções das eleições legislativas na França deste domingo (30) indicarem uma vitória da extrema direita no primeiro turno, a união entre forças democráticas para o segundo turno do pleito será fundamental. Essa é a opinião de analistas ouvidos pelo Brasil de Fato, logo após a divulgação de sondagens de bocas de urna.
A cientista política sa Florence Poznanski explica que "a grande incógnita, que será o eixo central desta semana antes do 2º turno, será a possibilidade de candidatos desistirem da disputa" para a votação que está marcada para o próximo domingo (07).
Isso porque, com o sistema eleitoral de dois turnos, é possível que a segunda fase do pleito seja disputada entre três candidatos em alguns distritos ses. Na maioria deles, a corrida deverá se dar entre um candidato do Reagrupamento Nacional (RN), de extrema direita, da Nova Frente Popular (NFP), de esquerda, e da coalizão governista, apoiada pelo presidente Emmanuel Macron.
"As esquerdas já anunciaram que caso cheguem em 3º lugar elas iriam desistir para apoiar o outro candidato no 2º turno contra a extrema direita. O que fará a diferença será a posição do governo, ou seja, se o partido governista respeitará essa 'Frente Republicana'", afirma a analista, que é membro do NFP.
Segundo os números divulgados por projeções neste domingo, o partido RN de Marine Le Pen e seus aliados obtiveram mais de 34% dos votos. Em segundo lugar aparece a coalizão de esquerda NFP, que teria mais de 29% dos votos, enquanto a grande derrotada teria sido a aliança de Macron, com pouco mais de 20%.
Logo após o resultado, o líder da coalizão de esquerda e do partido França Insubmissa, Jean Luc-Mélénchon, reafirmou a disposição da aliança de desistir das disputas nas quais seus candidatos estejam em 3º lugar. “Nossa diretriz é simples e clara: nem mais um voto para o Reagrupamento Nacional", disse.
Momentos após o pronunciamento de Mélénchon, o primeiro-ministro Gabriel Attal, aliado de Macron, disse que "a lição desta tarde é que a extrema direita está nas portas do poder" e que a "atitude responsável" seria a retirada de candidatos em terceiro lugar para "apoiar outros candidatos que defendem os valores da República".
Para Poznanski, a decisão do governo ainda gera dúvidas, já que Macron nas últimas semanas buscou "criminalizar a esquerda". "Ele chamou a esquerda de extremista, o que não é verdade. Ele tentou criminalizar [a esquerda], dizendo que ao lado da extrema direita, a extrema esquerda seria igual. Ele nunca se posicionou considerando que o bloco de esquerda era republicano", diz.
"Talvez considerando esse cenário, diante do risco do RN conquistar maioria absoluta, é possível que sob influência de grande parte do seu campo ele tome essa decisão", afirma.
O RN já anunciou que, se conseguir a maioria absoluta com seus aliados, irá indicar como primeiro-ministro o jovem líder Jordan Bardella, que aos 28 anos levou seu partido à vitória nas eleições europeias.
Fundado em 1972 como Frente Nacional, o partido foi liderado durante décadas pelo político extremista Jean-Marie Le Pen, conhecido pelas suas posições negacionistas em relação ao Holocausto, por proferir discursos de ódio e ser próximo de grupos fascistas. Sob a liderança de Marine Le Pen, filha de Jean-Marie Le Pen, o partido foi rebatizado como Reagrupamento Nacional em 2018, na tentativa de se afastar da imagem negativa associada ao seu fundador.
Participação não garante vitória
A unidade entre partidos e coalizões que apoiam a democracia também é vista como essencial para o professor de Relações Internacionais da UFABC Giorgio Romano. Ao Brasil de Fato, ele afirma que a extrema direita já é a gande vencedora das eleições e que o desafio agora para as outras coalizões será evitar que o RN conquiste maioria absoluta no Legislativo.
"O primeiro o seria criar uma frente democrática, onde se juntariam todos os partidos que não são de extrema direita. Se isso realmente acontecer, precisamos ver se a população aceita. Porque a extrema direita surge quando há uma grande insatisfação com Macron. Então quem vota na esquerda, pode até estar disposto a votar na extrema direita também, mas votar em candidatos do Macron já é mais difícil", diz.
O professor ainda analisa a alta participação eleitoral – mais de 59%, índice maior do que o do ano ado – e afirma que os níveis recorde se justificam pois "os dois lados entendem que esse é a hora da verdade". "A extrema direita pode finalmente ter a maioria e, do outro lado, as forças democráticas querem evitar isso".
Romano, no entanto, destaca que a saída de uma frente democrárica não é receita garantida, já que as manobras políticas devem se refletir em apoio popular. "Primeiro o: os partidos democráticos devem dar sinal claro para não votar na extrema direita, vote em qualquer candidato, e retirar 3º candidatos. Segundo o: a população tem que aceitar isso."