Ao presidir a última sessão como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta quinta-feira (17), o ministro Luís Roberto Barroso se despediu manifestando repúdio ao comportamento de Jair Bolsonaro (PL-RJ), que desde o primeiro dia de seu mandato atacou o sistema eleitoral e a democracia. “Uma das estratégias das vocações autoritárias em diferentes partes do mundo é procurar desacreditar o processo eleitoral, fazendo acusações falsas e propagando o discurso de que ‘se eu não ganhar, houve fraude’”, declarou, sem citar nomes.
“Trata-se de repetição mambembe do que fez Donald Trump nos Estados Unidos, procurando deslegitimar a vitória inequívoca do seu oponente e induzindo multidões a acreditar na mentira”, continuou Barroso. No trecho, o ministro se referiu à invasão do Capitólio. Em 6 de janeiro de 2021, uma multidão de manifestantes incentivados pelo então presidente Trump invadiu o Congresso dos Estados Unidos, promovendo depredações e ataques a seguranças, na maior ameaça à democracia americana da história moderna.
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Em referência ao isolamento do presidente brasileiro no mundo e sua péssima reputação entre líderes democratas, mas também sem citá-lo diretamente, Barroso afirmou: “Não é de surpreender que dirigentes brasileiros não sejam, hoje, bem-vindos em nenhum país democrático e desenvolvido do mundo. E nos eventos multilaterais, vagam pelos corredores e calçadas sem serem recebidos, acumulando recusas e pedidos de reuniões bilaterais”, disse.
Nesse trecho, o ministro aludiu à rocambolesca agem de Bolsonaro por Nova York em setembro do ano ado, por ocasião da Assembleia-Geral da ONU, quando andava pelas salas de recepção sem que nenhum outro chefe de Estado quisesse conversar com ele. Na mesma viagem, o presidente brasileiro comeu pizza na calçada de um estabelecimento que não permitia a entrada de pessoas não vacinadas
Voto impresso
Barroso também criticou a obsessão de Bolsonaro pelo voto impresso, dizendo que “boa parte do ano de 2021 foi gasto com uma discussão desnecessária, que significaria um retrocesso: a volta do voto impresso”. Ele lembrou que “as provas (de que o sistema eleitoral permite fraudes) não foram apresentadas porque simplesmente não existem”.
O ministro mencionou ainda a revolução digital iniciada no século ado, caracterizada pela “massificação da informação”. Apesar de democratizar a difusão da informação, os meios eletrônicos permitem os preocupantes “disfarces para mentiras e notícias fraudulentas da época da pós-verdade”.
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Sobre as redes sociais e aplicativos de mensagens, Barroso disse que, apesar dos fatores positivos, há um “componente extremamente negativo: a circulação de campanhas de ódio e desinformação, veiculação de mentiras deliberadas, teorias conspiratórias, ataques às instituições”.
“ado sombrio”
Segundo ele, em razão da experiência adquirida na eleição de 2018, o TSE montou “estratégia de guerra” para enfrentar desinformação voltada contra o processo eleitoral em 2020. Entre outras medidas, a corte criou uma coordenação digital de combate à desinformação; uma parcerias com mídias sociais e aplicativos de mensagens e com agências de checagens de noticias; e a celebração de acordo com provedores de internet. Na última terça (15), o TSE assinou acordos com oito plataformas digitais para combater a disseminação de notícias falsas no período eleitoral.
O ministro Edson Fachin, que vai suceder Barroso na presidência, também discursou. Ele elogiou a gestão do colega e sua atuação transparente “mesmo quando as ameaças de um ado sombrio não tão longínquo nos rondaram dia e noite”.